João Almeida assume ser “quase surreal” ter-se tornado no primeiro ciclista a vencer as Voltas à Suíça, Romandia e País Basco na mesma temporada, um feito assente em muito trabalho, mas também no facto de nunca desistir.

“É quase surreal. No ciclismo, hoje em dia, é muito difícil ganhar corridas, o nível é muito alto. Todas as vitórias têm um sabor muito grande. Já há muitos anos que o meu foco são as corridas por etapas, nem sempre tudo corre bem. Se me dissessem que esta temporada ia ganhar três, ia dizer ‘para lá de mentir’ ou ‘mentir é feio’, como se costuma dizer”, confessou, em declarações à agência Lusa.

No domingo, o luso da UAE Emirates venceu a Volta à Suíça, após protagonizar uma recuperação memorável, conquistando a sua terceira prova consecutiva por etapas do WorldTour – ganhou a Itzulia em meados de abril e a Romandia no início de maio, depois de já ter sido segundo na Volta à Comunidade Valenciana e no Algarve e sexto no Paris-Nice.

“Tenho cinco vitórias de classificação geral na minha carreira e três delas, do WorldTour, ganhei esta temporada seguidas. Fruto de muito trabalho, obviamente, mas as coisas têm corrido bastante bem”, resumiu o também vencedor das Voltas à Polónia e Luxemburgo, ambas em 2021.

Aos 26 anos, Almeida continua a deixar a sua marca na história do ciclismo português, mas também no mundial, já que se tornou no primeiro corredor desde o britânico Bradley Wiggins, em 2012, a ganhar três das sete principais corridas de uma semana na mesma temporada – as outras são o Paris-Nice, o Tirreno-Adriático, a Volta à Catalunha e o Critério do Dauphiné.

“Obviamente, temos de ser realistas: acho que pelo facto de haver uma ausência de um Tadej Pogacar, de um Jonas Vingegaard, as coisas ficam menos difíceis, mas claramente continua a ser bastante difícil”, concedeu.

E, nesta Volta a Suíça, o ciclista de A-dos-Francos (Caldas da Rainha) teve uma missão particularmente complicada: no final da primeira etapa, tinha uma desvantagem superior a três minutos para o líder, o francês Romain Grégoire (Groupama-FDJ), depois de o pelotão ter tardado em organizar-se na perseguição a uma fuga de homens importantes.

“Sabia que ia ser bastante difícil, porque era uma vantagem muito grande – três minutos. Por outro lado, sabia que não estava tudo perdido, porque havia bastantes corredores que tinham ficado no meu grupo, no pelotão, como o Félix Gall, etc., então não estava sozinho. É diferente”, analisou.

Favorito número um à partida para a prova suíça, o português tinha consciência de que os ciclistas à sua frente na geral, “apesar de serem bastante fortes”, estavam ao seu alcance.

“Sabia que eu era superior, que lhes conseguia ganhar tempo, só não sabia quando. A partir daí, começámos a fazer uma corrida a fundo e a agarrar todas as oportunidades que tínhamos para ganhar tempo, e deu bom resultado”, congratulou-se.

Almeida e a UAE Emirates traçaram “bem um plano”, que passava por “dar tudo” em “todas as etapas em que dava para ganhar tempo, mesmo que fosse pouco”.

E o plano não podia ter saído melhor: venceu a quarta e a sétima etapas, antes de destronar, finalmente, no contrarrelógio do último dia, também com uma vitória, o francês Kévin Vauquelin (Arkéa B&B Hotels), outro dos fugitivos da jornada inaugural, que se tornou líder ao quinto dia.

“Aquela adversidade na primeira etapa obrigou-me a ser mais agressivo, porque ou era mais agressivo e tentava ir a tudo o que mexia, ou então era desistir. […] Demos tudo o que tínhamos a dar e conseguimos alcançar o objetivo”, resumiu à Lusa.

(Re)conhecido pelas suas recuperações ‘impossíveis’, batizadas pelos adeptos da modalidade como ‘almeidadas’, aquele que é um dos melhores voltistas do pelotão internacional na atualidade riu-se quando o termo surgiu na conversa.

“Esta foi uma almeidada de outro nível, eu diria”, brincou o quarto classificado do Tour2024, que só esta temporada soma nove vitórias, todas elas do WorldTour, num palmarés que conta com um total de 22 triunfos.