
Nos últimos dias muito se falou da centralização de direitos televisivos dos jogos da I Liga. Há um ano de ser apresentado uma proposta final ao Governo, os clubes continuam sem chegar a um consenso. O recente pedido de suspensão de todo o processo por parte do Benfica, numa carta enviada à Liga, é um duro golpe que promete atrasar o já muito atrasado processo de centralização.
Portugal, recorde-se, é dos poucos países europeus onde os direitos de transmissão dos jogos das principais ligas são comercializadas de forma individual e não centralizadas, algo que aumenta o fosso entre os 'três grandes' e os outros clubes e diminuiu a competitividade.
O que é?
A centralização de direitos televisivos é um projeto que tem por objetivo definir regras os direitos das transmissões televisivas, ou seja, quanto cada clube das ligas profissionais (I e II Ligas) tem a receber pelas transmissões dos seus jogos. O objetivo é que nenhum clube possa negociar, sozinho, os direitos televisivos dos seus jogos, como tem sido feito até agora.
Com a centralização de direitos televisivos, haverá uma distribuição de receitas mais igualitária para os clubes da I e II Ligas e os clubes ditos pequenos irão receber mais, dispondo assim de verbas para melhorar as infraestruturas, contratar melhores jogadores, aumentando o seu nível.
Quando foi criado?
Em fevereiro de 2021 o Governo de António Costa, reunido em Conselho de Ministros, aprovou o decreto-lei que determina a comercialização centralizada dos direitos televisivos dos jogos da I e II Ligas de futebol, a implementar até à época desportiva 2028/2029.
O diploma impossibilitava que as sociedades desportivas participantes nas duas competições profissionais de futebol, I e II Ligas, comercializem de forma individualizada os direitos dos respetivos jogos relativos às épocas 2028/29 e seguintes, cabendo à Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e à Liga Portuguesa de Futebol Profissional (LPFP) a apresentação de uma proposta de modelo centralizado até ao final da época desportiva de 2025/26.
O documento estabelecia ainda que Autoridade da Concorrência devia aprovar o modelo centralizado de comercialização definido até 30 de junho de 2026.
Para ajudar neste processo, a Liga de Clubes criou a 02 de setembro de 2021 uma empresa - Liga Centralização - responsável pela comercialização centralizada dos direitos televisivos dos jogos da I e II Ligas de futebol a partir da época 2028/29, aprovado em Conselho de Ministros em 25 de fevereiro.
E se não houver consenso para uma proposta?
Se a Federação Portuguesa de Futebol e a Liga Portuguesa de Futebol Profissional não conseguirem chegar a um consenso sobre o modelo a apresentar, ou apresentar uma proposta que não seja aceite pela Autoridade da Concorrência, caberá ao Governo criar um modelo.
Quanto vale a I Liga?
A Liga Portugal e a Federação Portuguesa de Futebol pediram estudos a consultoras, que avaliam a I Liga entre os 275 e os 325 milhões de euros por ano. Mas este valor tem sido alvo de críticas. Numa entrevista à Lusa em agosto de 2024, Jorge Pavão de Sousa, diretor-geral da DAZN, questionava os "pressupostos de avaliação do negócio do ponto de vista económico", frisando que os 300 milhões por ano "é, pelo menos, 100 milhões de euros acima do valor atual que os operadores pagam pelo futebol português e que não conseguem monetizar".
O diretor-geral da DAZN, uma das empresas interessadas em comprar os direitos de TV da Liga, acrescentou ainda que nos últimos oito/nove anos, o mercado nacional não tem conseguido monetizar os atuais 185 milhões de euros que são pagos aos clubes por ano na comercialização individual
Como será feita a distribuição do dinheiro da centralização?
Este é um dos principais pontos de discórdia, apesar de ainda não haver valores. Os clubes 'grandes', principalmente o Benfica, têm pressionado para tentarem ter uma fatia maior do bolo. O seu presidente, Rui Costa, garantiu aos adeptos que o Benfica não vai "sair prejudicado" e que irá receber uma "verba adequada à grandeza desportiva, social" do clube.
A Liga de Clubes insiste que os clubes não irão perder dinheiro com a centralização de direitos televisivos, mas ainda não conseguiu explicar como.
Rui Pereira Caeiro, que era diretor executivo da Liga em 2024 e que agora é o representante da FPF na Liga Portugal, disse no ano passado, numa entrevista à Lusa, que metade do valor da venda centralizada dos direitos audiovisuais da Liga devia ser distribuído de forma similar e a outra metade dividida com base no desempenho desportivo, na implantação social ou nas audiências televisivas.
O valor total da venda dos direitos televisivos dos jogos terá de ser superior ao que foi praticado nos últimos contratos, ainda negociados individualmente, para que nenhum clube perca com a centralização.
A Liga espera chegar aos 300 milhões de euros por ano através da venda dos direitos de transmissão noutros países, internacionalizando da melhor forma a marca do futebol português.
Qual o modelo de distribuição?
Um dos grandes objetivos passa por dotar a Liga de maior competitividade. Atualmente, nas grandes ligas europeias, apenas Portugal e o Chipre não tem os direitos de televisão centralizados.
Aquando da aprovação do decreto-lei sobre a comercialização centralizada dos direitos televisivos dos jogos da I e II Ligas de futebol, o Governo deixou claro que era preciso reduzir a diferença de entre os clubes.
Na altura, o Governo, citando estudos, avaliou que a diferença entre a sociedade desportiva que mais recebia e a que menos recebia era de aproximadamente 15 vezes. Uma desigualdade sem precedentes, quando comparado, por exemplo, com Espanha e Itália onde diferença é de três vezes mais, ou com a Alemanha onde é 2,5 vezes mais. Em Inglaterra entre o clube que mais recebe e o que menos recebe é de 1,3 vezes mais.
Comentários